Quando oiço falar de 11 de Março só me lembro de estar debruçado, horas a fio, sobre os interiores dos automóveis, dos poucos que havia nesse longínquo ano de 1975. Eu e mais alguns companheiros mandávamos parar os carros na EN 125, junto à passagem de Lagoa (nunca percebi porque fomos para lá e não para outro sítio qualquer mais perto de casa). O centralismo democrático levou-me lá. Depois era espiolhar o carro todo, mandar o pessoal saír todo para fora, ao frio e ao vento, como nós, para ver se tinham armas da reacção escondidas. Não me lembro de termos encontrado algo: apenas umas chaves de ferramentas, latas velhas de óleo e garrafas vazias, imediatamente confiscadas, por serem potenciais cocktails molotov. Não sei quando regressei a casa. Sei que tinha 18 anos, a idade que a minha filha tem hoje.