quinta-feira, maio 27, 2021

Cidadania na sociedade digital

Resultado do debate na tertúlia sobre a sociedade digital, foi produzido um texto com os contributos dos participantes que se pode ler abaixo. Entretanto, ontem realizou-se mais uma tertúlia dedicada ao tema da Economia Local/Economia Global, sobre o qual daremos conhecimento em breve:

A sociedade digital

A súmula da conversa, realizada dia 12 de maio, em que as diferentes perspetivas e experiências, contaram para aprofundar conhecimento.

Dizem que o digital é nosso futuro, o nosso desígnio...Como está a sociedade digital a influir nas nossas vidas? A incluir-nos? A capacitar-nos? A excluir-nos? Como estamos a reagir perante esta inevitabilidade?

Os efeitos da chamada digitalização estão aí, embora nem sempre consigamos ter plena consciência dos seus efeitos, uns para o bem, outros para o mal.

Hoje o nosso atendimento nos serviços de saúde, ao levantar e depositar dinheiro, tratar dos nossos documentos pessoais, pagar as compras, tratarmos das responsabilidades fiscais, comunicar… dependem de processos digitais. E todo o nosso contacto com esses meios, deixa um rasto do nosso percurso e da nossa vida, como se deixássemos pegadas no caminho de terra bem humedecida pela intensa chuvada. São os algoritmos que registam os nossos passos e as nossas preferências, para de seguida nos manipular nas escolhas.

O relacionamento através da intermediação digital que aparenta facilidade, é fator de exclusão para muitos, a grande maioria, que não tem acesso – ou porque não tem rede ou porque não domina a tecnologia – tornando a administração mais inacessível. O antigo papel de 25 linhas, era afinal uma pequena exigência burocrática do passado, comparada com as exigências do presente. Os processos digitais acrescentam procedimentos, por vezes redundantes, somam burocracia à burocracia. E com isto temos degradação e inacessibilidade nos serviços públicos e privados.

Quem antes não sabia escrever ficava à parte. Quem hoje fica à parte é que não domina o digital. E dominar o digital não é saber enviar um e-mail ou colocar um gosto numa qualquer imagem ou frase de 10 palavras. É preciso saber entrar em plataformas, muitas das vezes sem alternativa, onde temos que tratar de assuntos essenciais à nossa vida. Estamos de fato num grande processo de exclusão. Perante a necessidade de capacitar os cidadãos digitalmente, até que tal aconteça, o que demorará anos, é preciso que os diferentes serviços públicos e privados não excluam e promovam o acesso, mediado e apoiado aos serviços.

As freguesias, os municípios, as associações podem e devem ter essa missão de combate à exclusão, como o tiveram no combate ao analfabetismo, agora na alfabetização digital. Nas novas competências das freguesias, os “espaços cidadão” estão previstos, mas poucas entidades estarão efetivamente com a preocupação de os usar como espaços de intermediação apoiada do cidadão com as plataformas digitais.

Ao ensino colocam-se hoje desafios fundamentais: para os adultos a aprendizagem sobre a utilização das ferramentas digitais; para as crianças e jovens aprender e compreender as “coisas da vida”, as relações pessoais, a utilização das mãos… E para ambos o treinamento da reflexão e da capacidade de pensar que lhe permita destrinçar o útil do inútil, o destrutivo e falso do verdadeiro e construtivo. Isto porque na internet circula tudo isso e é preciso criar defesas que nos protejam da desinformação, da manipulação, do aproveitamento dos nossos dados. É preciso dominar a tecnologia e saber como funciona para construir defesas, para  não nos deixarmos apanhar pela “rede”.

Quantos de nós conhecemos os acordos de privacidade que as grandes plataformas nos dão para ler e dar o acordo?  

A grande revolução da humanidade foi a sedentarização com fixação ao solo pela atividade agrícola. Agora estamos perante a revolução tecnológica e com ela a afirmação do capitalismo de vigilância. A digitalização e automatização leva à perda de milhões de postos de trabalho. Alteram-se os hábitos, a comida chega a casa “fast food”, perdem-se competências, diminuem-se as relações pessoais. Mas esta transformação não nos está a trazer menos tempo de trabalho, maior equidade social. A riqueza mundial concentra-se cada vez mais em menos pessoas e as diferenças entre os mais pobres e os mais ricos não continua a aumentar.

O trabalho não é valorizado, é cada vez mais precário e para sobreviver é preciso trabalhar em dois e três empregos. O poder político, está cada vez mais afastado da realidade, dominado pelo capitalismo financeiro e digital. Promete-se emprego em call-centers de “novos escravos” que atendem consumidores insatisfeitos após longas esperas ao telefone, respondendo a partir da chek list de respostas formatadas.

É perante esta tecnologia que em si não é boa nem má, que temos que ganhar competências para com elas nos protegermos do que é mau e destrutivo, aproveitando ao mesmo tempo o acesso ao conhecimento e informação e á produção e divulgação de conteúdos que possam ser úteis para a comunidade. Os suportes e ferramentas digitais, as novas tecnologias podem contribuir para disseminar valores e conhecimentos que sirvam a humanidade, que alertem para os perigos do consumismo de equipamentos de curta duração sempre a substituir-se e poluir, que promovam a equidade social e a responsabilidade ambiental, a prevenção e o acesso à saúde a educação.

A sociedade digital, inevitável, implica um período transitório que não exclua pelo não acesso ou não domínio e que valorize como essencial a capacitação de utilizadores informados.

António, Cristina, Hélder, Joaquim, Marília, Otílio, Rute, Sérgio, Sónia

sexta-feira, maio 21, 2021

A aldrabice dos rankings das escolas

O ideal seria ignorar a diarreia dos media, sobre o ritual anual dos rankings das escolas secundárias. Passados tantos anos, e após as desmontagens feitas por docentes, investigadores e até alguns governantes de esquerda (pela razão ideológica da igualdade de análise), a lengalenga continua a mesma. Mas o que fazer, senão continuar a responder com uma razão simples: é a escola pública que continua a educar contra a desigualdade e pela inclusão; as escolas privadas continuam a esconder os dados da sua elite privilegiada.

quinta-feira, maio 20, 2021

Querem greves boazinhas?

Hoje decorre uma greve dos trabalhadores em funções públicas. Os media traduzem o habitual: outros trabalhadores queixam-se da ausência de trabalho que lhes permitam viajar, usar serviços, receber educação, etc. Ora, não há greves sem implicações e é para isso mesmo que esta forma de luta foi criada. É natural que os patrões ou o governo protestem; agora, que trabalhadores se manifestem contrários a direitos inalienáveis é preocupante para a cidadania.

segunda-feira, maio 17, 2021

A sociedade digital do capitalismo da vigilância

A Casa da Cultura de Loulé (CCL) iniciou um projeto de tertúlias sobre questões fundamentais da sociedade, que irão decorrer às 2ªs e 4ªs quartas-feiras de cada mês, em locais a designar. O primeiro decorreu no pátio da sede da associação, no dia 12 de maio entre as 18:30 e as 20 horas e foi dedicado à Sociedade Digital. Apesar das poucas presenças, o debate foi vívido e com algumas ideias. Dele resultará um resumo que irá ser publicitado no sítio da CCL. Na conversa tive oportunidade de deixar algumas ideias, que mais tarde traduzi num pequeno texto, que se segue:

A sociedade digital, que parece herdeira da revolução industrial, deve o seu desenvolvimento à revolução tecnológica. Nas palavras do historiador israelita Yuval Noah Harari, foi a revolução agrícola aquela que levou o homo sapiens à sua própria domesticação, pela criação de animais e pelo plantio dos cereais. Depois da revolução cognitiva e da revolução agrícola, a revolução científica e tecnológica trouxe acesso ao conhecimento, à partilha de conteúdos e à interação humana em bolhas especializadas.

Parece que não podemos fugir de uma vida pautada pelas interconexões digitais, para produzir, consumir, estudar ou procriar. Pessoalmente, faço um esforço para encarar este tipo de vivência humana, usando parcimoniosamente o conhecimento e a técnica digital, evitando plataformas e mecanismos de devassa da identidade e do uso abusivo das tecnologias. Não tanto por excesso de privacidade, mas sobretudo pela defesa de uma postura de consciência social e política na vida diária.

No momento presente, os dados de milhares de seres no planeta valem ouro para o mercado global de produtivismo comercial e industrial, já controlado pelas grandes tecnológicas do consumo digital de matérias primas, produtos e conhecimento, os chamados GAFA (Google, Amazon, Facebook e Apple; não coloco aqui a Microsoft, como alguns fazem, por razões contrárias). Estas megalópoles universais controlam e manipulam pessoas, dados e governos, já que nem impostos pagam, e são o exemplo da escravatura de trabalho em todo o planeta. Usando as ditas redes ‘sociais’, conceito que esconde e abandona os sentidos de pertença e coesão física, pela interface de telemóveis e computadores, são armazenados dados privados para serem vendidos no mercado de consumo que se prepara desde o início deste século. A socióloga norte-americana Shoshana Zuboff chama a isto a era do capitalismo da vigilância, devido ao controlo total da vida dos cidadãos e da produção de mecanismos de predição de tecnologia digital que irão definir os consumos futuros. Estes, irão ser levados a cada casa, provavelmente controlada pela inteligência artificial, através de algum motorista da Uber e pagos por e-banking no telemóvel, rastreado pelo GPS da Google.

O que fazer? Talvez, como muitos disseram, voltar ao trabalho de educação, como no princípio do século passado, desenvolvido pelo associativismo popular e pelos sindicatos. Desta vez, com formação tecnológica, realizada através da sociedade civil (associações, grupos informais) e concomitante com a pressão sobre as instituições políticas e sociais para um trabalho de formação popular junto dos mais desfavorecidos tecnológicos, com vista à sua inclusão digital e à cidadania plena.  

Referências:

Harari, Yuval Noah (2020). Sapiens. De Animais a Deuses. História Breve da Humanidade. Amadora: Elsinore.

Zuboff, Shoshana (2020). A Era do Capitalismo da Vigilância. A disputa por um futuro humano na nova fronteira do poder. Lisboa: Relógio d´Água.


 

terça-feira, maio 11, 2021

Vieira e o palheiro

Vieira foi à comissão de inquérito ao Novo Banco com a estratégia de se diferenciar dos outros capitalistas devedores. Usando a sua prática popular e o traquejo da gestão do Benfica falou demais, interrompeu deputados e caiu nas esparrelas. Mostrou que era um testa de ferro, intermediário em negócios e um representante do Novo Banco no clube que dirige.


segunda-feira, maio 10, 2021

Pablo Iglésias, fenómeno da cultura de massas

Pablo Iglésias é um fenómeno político nascido dos movimentos sociais de esquerda em Espanha, mas também do capital cultural e social que proveio da sua presença na televisão e noutros media. Na altura, há cerca de seis anos, quando o Podemos já era uma força de interesse na esquerda anticapitalista, lembro-me que discutia com os meus companheiros o fogo fátuo que poderia ser aquela força política e, em especial, o seu líder incontestado. Estas forças políticas, heterodoxas e multi-ideológicas, naturalmente desenvolvem ciclos de cisões, conflitos e ascensões seguidas de queda. Depois da subida ao poder em Espanha, na coligação com o PSOE e com o lugar de vice primeiro-ministro, eis que Iglésias cai no seu desafio mais difícil: ganhar ao PP na Comunidad de Madrid. Agora sai de cena, do Unidas Podemos e da política institucional. Mas é importante dizer que, durante os últimos anos, Pablo Iglésias e a sua família sofreram um permanente assédio das forças ultradireitistas, com as piores ameaças de violência. Apesar dos erros, normalmente cometidos, o ciclo de rutura do bipartidarismo no país vizinho, que agora pode ser revertido, foi um momento de saúde para a democracia espanhola e o gesto de Iglésias deve ser louvado e compreendido.


 

domingo, maio 09, 2021

Agrocratas destapam a cara

Os ditos empresários agrícolas, que exploram os trabalhadores imigrantes asiáticos, escondidos por detrás de redes de tráfico de trabalho desumano, afinal têm habitações para albergar os seus contratados. Nada de novo no capital a oeste.

sábado, maio 08, 2021

O capitalismo moderno do ZMar

Conheço e frequento a costa vicentina há cerca de 40 anos. Em 1982 iniciei trabalho de investigação que durou, com intervalos, até 1984. Desde então frequento os concelhos do parque natural para visitas e férias. O projeto ZMar nunca me fascinou, sempre o achei soberbo e provinciano ao mesmo tempo, não só por ser considerado PIN mas por aquilo que achava ser e que se confirmou, com as aldrabices de negócios de venda de casas e das dividas que naturalmente agora acumula. Aliás, basta ver outras ofertas na área territorial que não usufruiram dos mesmos apoios, para se perceber que estamos perante um negócio financeiro que se está nas tintas para a comunidade e o desenvolvimento local.


Odemira: a desgraça de uns e o turismo de outros

Gonçalo M. Tavares a escrever sobre o futuro, em Os Cadernos e os Dias de há umas semanas, no "Expresso":

Não é sadismo, é turismo!

Todo o desastre, todo o massacre, será um dia uma atracção turística. Toda a dor de uns será um dia a alegria de outros. E não se trata de sadismo, mas de turismo.



sexta-feira, maio 07, 2021

ZMAR: Falidos mas com todo o tempo de antena

O caso ZMar mostra como o chamado direito à propriedade se sobrepôs ao direito à vida e à dignidade humana. Para os proprietários de bangalós, a sua segunda ou terceira casa, é mais importante do que as condições de saúde pública das comunidades que são exploradas no desenvolvimento agrícola. Isto é o capitalismo, como se sabe. Telmo Correia,  na AR, foi o megafone da direita na defesa dessa exploração. E os ditos proprietários, que durante uma semana tiveram antena dos media, não devem ter trabalho, coitados!


quinta-feira, maio 06, 2021

ZMar: Racismo e xenofobia

Não tenho tido tempo para postar por aqui, mas através do telemóvel vou adiantando de urgência o caso do ZMAR, um exemplo de xenofobia e racismo de proprietários e trabalhadores. Os media devem ter cuidado ao referir-se a um conflito entre locais e imigrantes. Não se trata disso e em breve postarei sobre o assunto.