[minha crónica publicada no último nº do jornal «barlavento»]
Tinha iniciado a aula com o 1º ano. A ideia era estudar o tema da educação comunitária, uma das formas mais interessantes da educação não formal, normalmente desenvolvida nas pequenas comunidades desfavorecidas de aprendizagens. Distribui pequenos textos de um capítulo do livro de Moaci Carneiro «Educação comunitária: faces e formas» que, em conjunto, constituem um capítulo do mesmo. Normalmente circulo pelos grupos a apoiar a leitura e o debate, pois neste caso o objectivo era desenvolver capacidades e atitudes relacionadas com a expressão oral e a comunicação. Porta-vozes dos grupos deslocam-se para os grupos com os números seguintes, para explicar o texto. Depois, é o grupo receptor que apresenta à turma os conceitos ou tópicos-chaves de cada texto que lhes foi comunicado.
Um dos grupos pediu a minha ajuda, porque não percebia nada do que lia: Ó professor, já lemos três vezes e não entendemos nada! Pedi que me exemplificassem e disseram-me que não sabiam o que era “cogitar”. O autor do texto escreve com uma linguagem filosófica, às vezes hermética, mas “cogitar”, meu deus, simplesmente quer dizer pensar; nunca ouviram falar de Descartes, que falava “Cogito Ergo Sum” – penso, logo existo? Arregalaram-me os olhos de espanto, as três alunas, como se estivessem a olhar para um palácio das mil e uma noites. Como as perguntas eram muitas, sentei-me na mesa para ajudar na leitura do texto. E verifiquei a total ausência da compreensão escrita, o reduzido vocabulário expressivo, o desconhecimento da língua. Melhor seria ter um dicionário ao lado. Têm que ler com um dicionário, que eu depois explico o resto, a coerência frásica, o sentido do texto. Bom, no final, ao menos o grupo receptor deste texto usou as explicações dadas por mim às alunas, sinal de que assim o transmitiram.
Senti-me a explicar alguns conceitos ao meu filho, de sete anos, quando me bombardeia com o pedido de sinónimos e significados das novas palavras do seu dia.
Pensei nos erros de Descartes. Na possibilidade de levar o livro de Damásio para a aula e desmistificar aquilo que disse do filósofo francês. Penso, logo existo! Ou melhor, sinto, logo penso. No final: existo, logo penso! O melhor é ler os livros com os meus alunos, começar a fazer jus às novidades da Declaração de Bolonha: auto-formação e estudo acompanhado, nas aulas e fora delas, que isso sim é o futuro do ensino superior. Pensemos nas tertúlias que poderíamos fazer com os alunos, de manhã na relva verde do estádio da Penha e à noite no Ministério da Cerveja. Não, não estou a brincar. Esta pode ser uma das soluções do processo de ensino/aprendizagem no ensino universitário. Agora, é decisivo que se pense uma Declaração, a preceito, para o parente pobre do sistema: o secundário.
Tinha iniciado a aula com o 1º ano. A ideia era estudar o tema da educação comunitária, uma das formas mais interessantes da educação não formal, normalmente desenvolvida nas pequenas comunidades desfavorecidas de aprendizagens. Distribui pequenos textos de um capítulo do livro de Moaci Carneiro «Educação comunitária: faces e formas» que, em conjunto, constituem um capítulo do mesmo. Normalmente circulo pelos grupos a apoiar a leitura e o debate, pois neste caso o objectivo era desenvolver capacidades e atitudes relacionadas com a expressão oral e a comunicação. Porta-vozes dos grupos deslocam-se para os grupos com os números seguintes, para explicar o texto. Depois, é o grupo receptor que apresenta à turma os conceitos ou tópicos-chaves de cada texto que lhes foi comunicado.
Um dos grupos pediu a minha ajuda, porque não percebia nada do que lia: Ó professor, já lemos três vezes e não entendemos nada! Pedi que me exemplificassem e disseram-me que não sabiam o que era “cogitar”. O autor do texto escreve com uma linguagem filosófica, às vezes hermética, mas “cogitar”, meu deus, simplesmente quer dizer pensar; nunca ouviram falar de Descartes, que falava “Cogito Ergo Sum” – penso, logo existo? Arregalaram-me os olhos de espanto, as três alunas, como se estivessem a olhar para um palácio das mil e uma noites. Como as perguntas eram muitas, sentei-me na mesa para ajudar na leitura do texto. E verifiquei a total ausência da compreensão escrita, o reduzido vocabulário expressivo, o desconhecimento da língua. Melhor seria ter um dicionário ao lado. Têm que ler com um dicionário, que eu depois explico o resto, a coerência frásica, o sentido do texto. Bom, no final, ao menos o grupo receptor deste texto usou as explicações dadas por mim às alunas, sinal de que assim o transmitiram.
Senti-me a explicar alguns conceitos ao meu filho, de sete anos, quando me bombardeia com o pedido de sinónimos e significados das novas palavras do seu dia.
Pensei nos erros de Descartes. Na possibilidade de levar o livro de Damásio para a aula e desmistificar aquilo que disse do filósofo francês. Penso, logo existo! Ou melhor, sinto, logo penso. No final: existo, logo penso! O melhor é ler os livros com os meus alunos, começar a fazer jus às novidades da Declaração de Bolonha: auto-formação e estudo acompanhado, nas aulas e fora delas, que isso sim é o futuro do ensino superior. Pensemos nas tertúlias que poderíamos fazer com os alunos, de manhã na relva verde do estádio da Penha e à noite no Ministério da Cerveja. Não, não estou a brincar. Esta pode ser uma das soluções do processo de ensino/aprendizagem no ensino universitário. Agora, é decisivo que se pense uma Declaração, a preceito, para o parente pobre do sistema: o secundário.