A literatura tem mecanismos para nos atrair, mas sobre as motivações de leitura não irei discorrer por ora. Há livros que compramos e que ficam a olhar para nós na estante, com os quais mantenho uma relação de namoro afastado, abro e leio umas páginas e, de acordo com o momento, sigo até ao fim, com interrupções ou ansiedade, ou abandono para outros tempos. «Hotel Memória», de João Tordo, foi um daqueles livros que peguei e larguei a meia dúzia de páginas. Foi o programa de Carlos Vaz Marques, para a RTP1, “Herdeiros de Saramago” que me levou a voltar ao segundo livro do autor. A história herda as narrativas policiais e surrealistas de Allan Poe e presta homenagem a Melville, através de um Ismael heterodefinido, que busca a redenção pessoal na memória de várias histórias de amor e amizade, frustrantes, ou de um Bartleby, personagem que preferia sempre não fazer algo proposto ou imperativo. Pena é, por isso, que a personagem do fadista português desaparecido (Daniel da Silva) não tenha mais substância, mas na verdade o que poderia compor o afadistado percurso desse exilado luso em Nova Iorque?