A morte de Benazir Bhutto desencadeou uma onda de protesto e de violência no Paquistão e um carinho por todo o mundo democrático. Mas convém não alardear muito, pois o Paquistão é um país culturalmente muito complexo e politicamente muito incerto. O ponto de vista ocidental cai, com facilidade, no etnocentrismo de análise e não percebe vários aspectos:
1. Tal como os restantes partidos, o PPP (Partido do Povo do Paquistão) é pertença da família Bhutto há muito tempo, e funciona com sucessões dinásticas; veja-se como a presidência foi entregue ao filho primogénito de Benazir (19 anos) que, sendo jovem e indo estudar para o Ocidente, deixa a gestão corrente nas mãos do pai, há tempo afastado da mãe.
3. Para conhecer melhor o assunto, entre muitas outras possibilidades, ver o post de Miguel Portas, A incomparável assassinada.
4. Indispensável, é o ensaio de Christopher Hitchens, colunista da revista Vanity Fair e da Slate Magazine. Nesta última publicou uma análise muito conhecedora e acutilante sobre o caso, transcrita no El País de ontem. O artigo intitula-se “Una hija del destino”. Deixo um extracto, traduzido por mim:Nem o mais severo crítico de Benazir Bhutto seria capaz de negar que possuía um valor físico extraordinário. (...) Resulta grotesco, desde logo, que o assassinato se tenha produzido em Rawalpindi, a cidade onde vive entrincheirada a classe militar dirigente do país. (...) Mas custa fazer uma análise cui bono cuja conclusão seja que o general Perez Musharraf, o presidente actual, seja o beneficiário de sua morte. A culpa é provavelmente do eixo Al Qaeda/Talibãs, talvez com alguma ajuda de seus numerosos simpatizantes encobertos e não tão encobertos no organismo inter-serviços das forças de inteligência paquistanesas.