Alternativas à terra queimada, precisam-se?
Em cada frase dos responsáveis políticos no poder, em cada artigo de jornais e revistas, nos documentos de estratégia e orientação para o desenvolvimento regional e municipal, está bem evidenciado que a actividade turística constitui o motor económico da região, e como tal, tem que ser salvaguardada e potenciada.
Apesar destas tão “evidentes” certezas é lícito duvidar. E muitos como eu duvidam, questionam-se sobre este modelo da economia regional, assente nesse pretenso motor.
Afinal para que nos serve o turismo, está a contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população residente e para a qualificação do território? Enquanto actividade económica produz receitas para a região, de forma a melhorar as suas infra-estruturas e serviços, e aumentar o rendimento das famílias?
Temos por vezes tendência para avaliar e julgar as actividades, os actos e os objectos, contrapondo pólos opostos: é bom ou mau, é simpático ou antipático, é bonito ou feio.
Não quero aqui trazer-vos, uma proposta de reflexão reducionista.
O turismo proporciona certamente um conjunto de contributos positivos para a região, mas também outros negativos.
Se formos capazes de pensar desta maneira, poderemos racionalmente posicionar-nos para que se corrija o que está mal e se valorize o que é mais correcto tendo em conta os que aqui vivem e a sustentabilidade deste território que deve ser por nós entendido como casa transitória que é preciso deixar cuidada e habitável aos vindouros.
Mas será esta, uma preocupação dominante?
Apesar das intervenções públicas referindo a sobrecarga do betão sobre a faixa litoral e a necessidade de salvaguardar e promover os valores naturais e culturais, reconhecendo-os como decisivos, continuamos a querer ocupar toda a frente de costa, se possível construindo o mais próximo possível do mar. Esquece-se mesmo a salvaguarda de pessoas e bens num quadro previsível de subida do nível das águas do mar ou da repetição de catástrofes idênticas às ocorridas no século XVIII, em que o mar galgou a terra, em alguns sítios até 3 e 4 quilómetros.
E os nossos produtos? Estão os agentes turísticos e as entidades oficiais preocupadas com a sua valorização, para que possam afirmar-se como genuínos da nossa oferta ?
As leis são obstáculos intransponíveis para os pequenos promotores e palco para os juristas das grandes empresas esgrimirem com os juristas da administração pública. O que sabemos fazer vamos abandonando, por problemas com a legalização e com a comercialização.
Quase tudo o que consumimos vem do exterior, do resto do País ou, sobretudo do estrangeiro. Logo, o que fornecemos aos turistas já anteriormente comprámos ao exterior. No Algarve, terra da laranja, até o sumo que se fornece em grande parte da hotelaria é feito com uns “pósinhos” ou a partir de concentrados importados, sabe-se lá de onde.
Afinal os grandes benefícios económicos que o turismo poderia trazer á região, contribuindo para o aumento da produtividade, naquilo que sabemos fazer e em que podemos apresentar particularidades que nos diferenciem não está a ser potenciado pela actividade turística.
E a paisagem, o património natural e construído, enquanto produto?
Perante a reconhecida betonização do litoral propõe-se agora aldeamentos de baixa densidade para o interior. Só que essa baixa densidade não reaproveita o património construído existente, não se propõe contribuir para a revitalização de aldeias e lugares quase ou praticamente abandonados, mas disseminados pelo território, numa escala de povoamento comportável que no passado, naturalmente o Homem foi encontrando.
A nova vaga, para ocupar o interior com actividade turística é afinal mais do mesmo como me evidenciavam há poucos dias. São os mesmos, modelos e operadores, que perante o esgotamento do negócio do litoral se propõem avançar para o interior. Não para recuperar ou valorizar o património natural, a arquitectura rural, as práticas e saberes dos residentes, mas sim para ocupar o solo, mais solo, com novas construções, continuando o negócio da especulação imobiliária que é o que dá dinheiro. E quando se acabar, acabou-se, que nada os prende a esta terra …e o dinheiro não tem rosto, nem afectos!
Por isso, reconhecendo a importância do turismo, não o concebo desenquadrado das pessoas, dos seus saberes, das suas actividades, da paisagem … Teremos a coragem de substituir, em nome da sustentabilidade e do futuro, a prática de terra queimada do presente?
Joaquim Mealha Costa
Em cada frase dos responsáveis políticos no poder, em cada artigo de jornais e revistas, nos documentos de estratégia e orientação para o desenvolvimento regional e municipal, está bem evidenciado que a actividade turística constitui o motor económico da região, e como tal, tem que ser salvaguardada e potenciada.
Apesar destas tão “evidentes” certezas é lícito duvidar. E muitos como eu duvidam, questionam-se sobre este modelo da economia regional, assente nesse pretenso motor.
Afinal para que nos serve o turismo, está a contribuir para a melhoria da qualidade de vida da população residente e para a qualificação do território? Enquanto actividade económica produz receitas para a região, de forma a melhorar as suas infra-estruturas e serviços, e aumentar o rendimento das famílias?
Temos por vezes tendência para avaliar e julgar as actividades, os actos e os objectos, contrapondo pólos opostos: é bom ou mau, é simpático ou antipático, é bonito ou feio.
Não quero aqui trazer-vos, uma proposta de reflexão reducionista.
O turismo proporciona certamente um conjunto de contributos positivos para a região, mas também outros negativos.
Se formos capazes de pensar desta maneira, poderemos racionalmente posicionar-nos para que se corrija o que está mal e se valorize o que é mais correcto tendo em conta os que aqui vivem e a sustentabilidade deste território que deve ser por nós entendido como casa transitória que é preciso deixar cuidada e habitável aos vindouros.
Mas será esta, uma preocupação dominante?
Apesar das intervenções públicas referindo a sobrecarga do betão sobre a faixa litoral e a necessidade de salvaguardar e promover os valores naturais e culturais, reconhecendo-os como decisivos, continuamos a querer ocupar toda a frente de costa, se possível construindo o mais próximo possível do mar. Esquece-se mesmo a salvaguarda de pessoas e bens num quadro previsível de subida do nível das águas do mar ou da repetição de catástrofes idênticas às ocorridas no século XVIII, em que o mar galgou a terra, em alguns sítios até 3 e 4 quilómetros.
E os nossos produtos? Estão os agentes turísticos e as entidades oficiais preocupadas com a sua valorização, para que possam afirmar-se como genuínos da nossa oferta ?
As leis são obstáculos intransponíveis para os pequenos promotores e palco para os juristas das grandes empresas esgrimirem com os juristas da administração pública. O que sabemos fazer vamos abandonando, por problemas com a legalização e com a comercialização.
Quase tudo o que consumimos vem do exterior, do resto do País ou, sobretudo do estrangeiro. Logo, o que fornecemos aos turistas já anteriormente comprámos ao exterior. No Algarve, terra da laranja, até o sumo que se fornece em grande parte da hotelaria é feito com uns “pósinhos” ou a partir de concentrados importados, sabe-se lá de onde.
Afinal os grandes benefícios económicos que o turismo poderia trazer á região, contribuindo para o aumento da produtividade, naquilo que sabemos fazer e em que podemos apresentar particularidades que nos diferenciem não está a ser potenciado pela actividade turística.
E a paisagem, o património natural e construído, enquanto produto?
Perante a reconhecida betonização do litoral propõe-se agora aldeamentos de baixa densidade para o interior. Só que essa baixa densidade não reaproveita o património construído existente, não se propõe contribuir para a revitalização de aldeias e lugares quase ou praticamente abandonados, mas disseminados pelo território, numa escala de povoamento comportável que no passado, naturalmente o Homem foi encontrando.
A nova vaga, para ocupar o interior com actividade turística é afinal mais do mesmo como me evidenciavam há poucos dias. São os mesmos, modelos e operadores, que perante o esgotamento do negócio do litoral se propõem avançar para o interior. Não para recuperar ou valorizar o património natural, a arquitectura rural, as práticas e saberes dos residentes, mas sim para ocupar o solo, mais solo, com novas construções, continuando o negócio da especulação imobiliária que é o que dá dinheiro. E quando se acabar, acabou-se, que nada os prende a esta terra …e o dinheiro não tem rosto, nem afectos!
Por isso, reconhecendo a importância do turismo, não o concebo desenquadrado das pessoas, dos seus saberes, das suas actividades, da paisagem … Teremos a coragem de substituir, em nome da sustentabilidade e do futuro, a prática de terra queimada do presente?
Joaquim Mealha Costa
[publicado na Voz de Loulé de 1 de setembro]