quinta-feira, janeiro 27, 2022

As escolhas dos eleitores plurais das esquerdas da esquerda

No sábado (15) assisti ao webinar «Por Uma Maioria Plural de Esquerda», moderado pelo jornalista Daniel Oliveira e com a participação de cidadãos que subscreveram o manifesto com o mesmo título, antes referido, e publicado no passado dia 4 de janeiro no jornal Público. As intervenções e os testemunhos gravados, marcam uma posição de proximidade com a iniciativa convergente realizada por setores da esquerda em 2015, nos finais dos tempos austeritários da troika. As bases da carta são claras: o PS por si só não consegue desenvolver um programa de corte com as medidas de austeridade ainda em vigor, nem governar com um programa de defesa dos direitos e garantias dos trabalhadores, nos campos laboral, social e político. Só a pressão da cidadania de esquerda, veiculada pelos eleitores dos partidos à esquerda do PS, tem condições para criar um movimento dinâmico de viragem contra a pressão da direita mascarada e contra a hegemonia das frações liberais do  Partido Socialista. Estas ideias obrigam-me a alguns breves comentários:

i) É preciso desfazer a ideia de que os votos são dos partidos. Cada voto é uma opção flexível e contextual de cada cidadão, que o altera conforme a circunstância. Mas é também preciso contrariar a ideia de Jerónimo de Sousa, ou de Catarina Martins, de que os votos são dos eleitores e no final é que se contam. Estas posições não deixam de mostrar um certo sectarismo invertido com capa democrática.

ii) Poucos intervenientes no debate referiram o Livre como fazendo parte de uma solução no parlamento, e no subsequente apoio à governação de esquerda. Talvez esta posição ainda releve dos engulhos de ter sido Rui Tavares o primeiro a desenhar uma geringonça à esquerda e de, nos debates realizados, ter marcado a maior aproximação ao PS. Mas, se os votos dos eleitores no Livre contarem, eles também contarão para uma maioria plural de esquerda (sublinho o plural).

iii) Na sua intervenção (aliás, lida de um texto escrito na altura do chumbo do orçamento em outubro de 2021), José Neves, historiador afeto ao PCP, defendia um modo de votação mais consentâneo com a realidade dos pesos partidários à esquerda. Numa resposta a questões colocadas, Neves defendia a diferença de votações dos eleitores que vivem no Alentejo ou no Algarve e que, nesses casos, poderiam votar de acordo com a utilidade dos votos nos partidos que elegem ou estão próximos de eleger deputados. A propósito, subentende-se que a CDU (PCP+PEV) no distrito de Évora, que pode ter o risco de não eleger João Oliveira -seu líder parlamentar – poderia receber os votos de toda a esquerda da esquerda; também no Algarve, onde o único partido que elegeu para além do bloco central foi o BE, seria este partido a conter os votos dos eleitores plurais.

iv) O modo eleitoral opcional, deixado por José Neves, parece ser abstruso mas não deixa de  ser um princípio a considerar nas eleições do próximo dia 30. Como na verdade os votos são dos eleitores, todos aqueles que não estão afiliados têm o direito e o dever (acrescento) de encontrar fórmulas novas de participação eleitoral mais representativas do sentido sociológico do país.

v) Não sei, não pensei ainda, como este modo, atrás descrito, funcionaria noutros círculos eleitorais, por exemplo em Lisboa, mas é um caminho aberto…

[17janeiro22]