Há uma ideia comum, diria mesmo do senso
comum, originária normalmente do desconhecimento, que afirma que os livros de
José Saramago não têm pontuação. Ora, a pontuação tem vários cenários, técnicas
e metodologias possíveis. E Saramago adota, de acordo com o seu interesse - ou
o da narrativa que força o seu sentido, entendamo-nos – a forma mais adequada à
sua escrita e ao leitor. Por exemplo, a última obra que li do autor, «História
do Cerco de Lisboa» (Porto Editora, 2014), não inclui qualquer tecnicidade de
discurso direto das personagens, quer dizer, não inclui traços de iniciação de
voz. A solução é o uso de maiúsculas no início das falas das personagens: “Lembra-me
uma cobra que se tivesse arrependido no momento de morder a cauda, Bem observado,
senhor doutor, realmente, por muito agarrados que estejamos à vida, até uma serpente
hesitaria diante da eternidade, Faça-me aí o desenho, mas devagar, É facílimo…”.
E assim por diante, habituamo-nos rapidamente a reconhecer as falas de cada
personagem, sem perder qualquer dinâmica de leitura e entendimento.