sexta-feira, fevereiro 25, 2011

A Costa dos Murmúrios


A Costa dos Murmúrios, 4º livro de Lídia Jorge, tem comigo uma relação de amor-ódio. Explico. Li entusiasmado, assim que foram editados, os seus dois primeiros livros, O Dia dos Prodígios e O Cais das Merendas. A Costa dos Murmúrios deixou o contexto barroco do Algarve e entrou na cena problemática das feridas da guerra colonial. A abordagem da autora era muito simbólica e metafórica, como se esperaria, mas os gritos de repulsa da guerra eram ténues e muito femininos. E a narrativa, em duas partes, perdia-se em rodriguinhos de muito pensamento, sem base de ação que a suportasse. Por isso o livro ficou parado, ali a páginas cinquenta, durante muitos anos na minha estante. Por estes meses, e em tempo de comemorações louletanas, vinte anos após (os mesmos que separam a noiva Evita, da narradora Eva Lopo) peguei e larguei o livro, de novo. Terceira tentativa, por culpa do filme homónimo da Margarida Cardoso, que esquece as memórias adultas de Eva Lopo, e filma cruamente a ação colonial dos anos 60. E acrescenta o que faltava no livro: uma crítica simbólica mas expressionista da guerra, que matou e feriu muita gente dos dois lados da barricada. Talvez fosse preciso esperar pelo século XXI para olhar de outra forma A Costa dos Murmúrios e para me obrigar a terminar a leitura da obra.