sexta-feira, junho 21, 2019

A bebedeira do mar


A obra acima - que deveria ser lida por toda a gente - é uma enciclopédia simples de saber que estou a ler de novo. Os livros de Bryson são isso mesmo: tentações de saber.
No capítulo XVI (O Planeta Solitário), o autor descreve as investigações malucas dos Haldane, pai e filho, sobre a intoxicação por azoto, que se transforma «numa droga potentíssima a profundidades superiores a 30 metros». Estava na praia quando li estas páginas (359-371) e por associação de ideias veio-me à memória as histórias contadas pelos pescadores submarinos da Carrapateira, em Aljezur, no verão de 1982. Estávamos junto da praia nos primeiros esboços abarracados de alojamento turístico de um amigo, ouvindo os pescadores que tinham ido pescar sargos e liças para o nosso jantar. E acabado o vinho, o acompanhamento disponível de medronho obrigava a uma magia de audição de histórias e a desenhos inextrincáveis. E aí eles contaram como a profundidades altas, na costa vicentina, entre as arribas de xisto e basalto, perdiam os sentidos na apneia de pesca, e ouviam chamados cânticos de sereias e uma coloração vegetal de algas em arco-íris, obrigando-os a deixar armas e equipamento para o fundo do mar. Só depois, a consciência os trazia, em suspensão, para a superfície. Era o azoto no cérebro, pois claro!

terça-feira, junho 04, 2019

Agustina




Confesso que «A Sibila» nunca sibilou aos meus ouvidos, talvez porque no meu tempo «Os Maias» davam cartas no liceu, romance que também não li. Na altura, era o marxismo que me ocupava as leituras, de ensaios e romances.
Em 1988, numa fase de busca de individualidade libertária-filosófica comprei «Prazer e Glória», acabado de sair, um romance sobre uma família burguesa – como era o universo de Agustina – mas com o bastardo artista João Pinheiro (talvez lembrando o traído Pinheiro Alves, marido da amante de Camilo, esse sim autor boémio de que li muito) a contrariar o universo.
Pedro Mexia dizia, ontem a propósito da literatura de Agustina, que ela era sobretudo criticada por motivos ideológicos, como autora burguesa e elitista, mas que a devíamos olhar pelo lado puramente literário. Lembro-me que na altura achei prazeirosa e gloriosa a crítica de Agustina à atitude miserável, ignorante, e incivilizada do povinho português. E essa era também a minha impressão. Há semanas atrás voltei a pegar no livro da Guimarães Editores, para o reler, e ali está ele na página 19, de canto dobrado: “Eram gente de prazer e de glória, que em tudo morre para em tudo permanecer”.